sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Os Subterrâneos - Jack Kerouac

 No princípio, a maneira como se distribuía o texto incomodou-me por demais, o achei tosco, impulsivo, me parecia um devaneio lunático, como se o tipo estivesse há 3 dias cheirando cocaína, bebendo café e escrevendo sem parar tudo o que lhe viesse a cabeça, como se nada pudesse ser desperdiçado ou mesmo filtrado. Mas logo antes da metade do livro, acredito, adaptei-me a esse ritmo frenético kerouaciano, com todos os seus parênteses seguido de parênteses seguidos de mais parênteses, quase sem vírgulas, pontos ou divisões, um raciocínio e relato que levava a outro e a outro ainda, me fazendo às vezes voltar a página para recordar o que era mesmo que estava sendo dito ali.
 Mas a importância artística e histórica desta obra é indiscutível, tanto pelo estilo único e incomparável de Kerouac, quanto pelo que ali é apresentado, um romance entre 2 "subterrâneos", hips, beats, em uma San Francisco de clima caótico e alucinado, em meio a discussões malucas literárias, festas e bebedeiras entre poetas, artistas, regado a muito bop  e muitas noites sem dormir, além da profecia triste e melancólica do fim do grande escritor, proferida por ele mesmo neste livro, seu fim pelo alcoolismo e loucura.

Uma grande obra, não a melhor do mestre, mas uma fundamental. 





Crônica do Aniversário

 Aniversário, o que é isso senão uma data para nos deprimir e nos fazer gastar pestanas pensando e sofrendo? Quando não uma grana considerável.
 Os anos são calculados pela soma de cada grau; valor, de um todo, que soma trezentos e sessenta e poucas porções, que equivalem e medem de fato a volta completa no sol da terra. Então são trezentos e sessenta e cinco dias, mais algumas horas, segundos etc. Vago e inexato. Impreciso, sempre vão sobrar nessa contagem dias, horas, minutos, segundos. Assim surgindo o ano bissexto, o dia 29/02, para compensar essa medida e rotas inexatas, evidenciando a imperfeição e variação de tudo. Então aquele dia específico não tem nada a ver com o dia em que nascemos, ou qualquer dia, volta, que já tenha ocorrido na terra. Seria uma posição próxima em que a terra estaria antes, na mesma marca; dia, de um ano atrás, ou uma volta, mas não exatamente a mesma, além de que, todo o cosmos estaria diferente, devido sua longa e contínua expansão.
 Ficamos mais velhos? Enrugamos? Perdemos a visão? A coluna dói? Ficamos mais precários, sensíveis e doentes? Sim, óbvio, mas isso ocorre todos os dias, não naquele dia específico, não no aniversário apenas, não é somente este que vai nos envelhecer imediatamente, mas todos os dias, a cada minuto, segundo, todos os sintomas da velhice chegam simultaneamente, todo o tempo. O tal dia do aniversário não determina ou transforma qualquer coisa, apenas soma-se como todos os outros dias. Como seres orgânicos, estamos destinados a perecer e servir de adubo aos que ainda rastejam nesta terra. As células freiam. A produção decai. O sistema falha. E a coisa segue em uma regressão física. A energia dissipa-se, a mecânica química entre cérebro e terminações nervosas não são precisas e imediatas. O rendimento murcha. E nos frustramos com nossas experiências ainda não registradas que se apagam, nossas histórias que vão morrendo conosco. Toda nossa existência se resume em memória, se houver sorte, pois só permaneceremos vivos em gerações futuras por meio desta.
 O aniversário serve para imaginarmos, nos prepararmos, criar uma expectativa, uma ambição, de que seja um dia especial. O seu dia. Que algo especial irá acontecer. Quando passam as horas e percebe-se então que foi tão igual e corriqueiro quanto os outros, vem esse sentimento mesquinho e deprimentemente humano, esse vazio da esperança destroçada. A decepção.
 Um símbolo apenas, uma marca do nosso nascimento. Mobilizando pais e padrinhos a produções expansivas de festas efêmeras que servem apenas como pretexto, ou até desculpa, pela falta de atenção necessária diária para com os pequenos, como um modo de ostentação de valores materiais, posses e figurinos, induzindo a uma futilidade burguesa desde cedo o indivíduo homenageado. Promovendo comilanças descomunais, bebedeiras, danças e música, tudo enfatizando o aniversariado, porém sendo oferecido aos demais convidados que, muitas vezes, saem reclamando e apontando defeitos de modo geral na festa e nas pessoas que por ali estavam.
 As debutantes. Talvez o maior exemplo de imbecilidade no quesito comemoração de aniversário. Talvez o maior exemplo de todo esse comportamento mórbido e sinistro apresentado. A simples passagem por esse dia que marca no calendário nosso nascimento deve ser confraternizada com entes queridos, filhos, mães, esposas e namorados, amigos próximos, e ninguém mais! Um aniversário de casamento, de namoro, merece um jantar romântico, uma boa noite de sexo, mas todos os casais devem praticar isso constantemente, não apenas nesta maldita data que nada representa, além da obrigação de ter que se fazer algo em relação a ela. Um jantar forçado de cara fechada. Uma festa deprimente. Uma noite tão sonsa que, talvez se não fosse relacionada à referida data, seria especial.
 O ser humano é cheio de símbolos sagrados, de dogmas estipulados de outras eras que, já não faziam sentido no momento de sua criação, o que dirá dos tempos atuais. Precisamos aprender a nos desvencilhar de práticas antigas e nocivas à nossa existência, à vida, à razão e à sobrevivência do planeta.
 A debutante e a cerimônia que apresenta a filha jovem à sociedade, como um troféu a ser conquistado, justificando os antigos dotes e preços, dinheiro oferecido pelo pai a quem se encorajava a retirar sua filha de casa pela mão. O que me espanta é ver tantas mulheres que não reconhecem nestas práticas a depravação da mulher tal como objeto, em simples ferramenta à servir a vontade do homem, prática absurdamente cristã, que subjugou o feminino cruelmente por tanto tempo, práticas que ainda resistem em comunidades mais remotas, onde as mulheres são apresentadas na sua adolescência a pretendentes munidos de posses financeiras, e que em seguida, se tornam escravas das funções domésticas, sem opinião e tampouco personalidade.
 E ainda temos o canto extremamente ridículo entoado em todas as cerimônias aniversariais, o Parabéns a Você. A música é datada do século XIX, composta por professores para as crianças em uma determinada escola nos Estados Unidos, porém ela continha uma outra letra, uma inocente saudação matinal em que as crianças então cantavam no começo de sua jornada escolar. Era popular tal canção, no entanto, passaram-se alguns anos e alguém em algum livro idiota alterou a letra, transformando a singela música nessa retumbante, insuportável e ridícula ode a um dia que, sim, marca de alguma forma nosso nascimento, mas não evidencia de fato qualquer valor de nossa passagem pela terra, apenas essa data efêmera que nos impõe obrigações materiais que resultam, muitas vezes, em frustração, ao invés da planejada diversão e homenagem. Talvez esse canto tenha algum valor se pensarmos na libidinosa performance de Marilyn Monroe ao então presidente norte americano John F. Kennedy que, com certeza, inspirou pensamentos luxuriosos e excitantes, mesmo com uma letra tola e inexpressiva. É isso, a data, o encontro, é você quem faz, e de resto, são apenas bobagens ultrapassadas.



They're Free

They're free
Free as a bird
Free as a demon
Free as an artist
Free as a hole in the sky
Free as a killer
Free as a worm
Free as a lie
Freedom IS a lie
Free as a hungry dirty mad beggar in the streets which are asylums


Maybe you’re free, if you're dead..

Palavras

Palavras, tenho muitas
E muitas mais hei de pegar
Por isso não há pressa
Não tenho que ser afoito, em pescá-las
Elas vem e vão, sobrevoam
Me basta apenas mirar e agarrar

E mais palavras tenho para rabiscar

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Pra ela

E essas letras me perturbam, me paradoxam
Não me reconheço, nesses rabiscos ultra alucinados imperativos
Me censuro, me podo
Não enxergo o que outrora mostrei
Não me raciocínio, não me desvendo

E não tenho uma saída, não me resolvo
Sigo preso dentro desta...coisa, não conheço o símbolo para essa coisa...
Tampouco algo semelhante para a minha vontade
Mas sei que, o pouco que sei serve, basta, para medir o que já sei
E o nada que sei é que sei que tenho consciência, naturalmente
Com todos os infortúnios e negativas
Com todas as variações atmosféricas e inconstâncias sentimentais
Mesmo com todas as burrices evidentes, todas as estupidezes e idiotices
Aplicadas, sentidas, vividas, reclamadas e defendidas
Mesmo com toda essa impotência escancarada, esse minúsculo tamanho
Assim mesmo, eu, burro, pequeno e frágil
Simples, complexíssimo, desmontado, melhorado, atordoado, esculhambado
Mesmo assim, eu sei, tenho certeza, porque eu sinto, e eu devo e busco viver o que sinto
E a minha vida, o meu dever comigo, para minha existência, para a minha consciência e passagem pela coisa que chamamos terra
Eu sei, vou cada vez mais fundo, mais crente, mais confiante, mas rígido e forte com os golpes, e mais sábio, ou menos tolo, para o meu prazer, o meu sentido, que é comum, que é dividir a vida, o ar, o conhecimento e experiência, tudo aqui é de todos
Todos um, juntos, lutando e se amando, e eu já escolhi a minha metade
O motivo, a razão para seguir, acordar e compartilhar com tudo
Minha razão é óbvia, e digo isso à mim mesmo, porque a isso deve a minha vida, a vida vivida, gozada, a também divulgada ideia e sentimento chamado felicidade
Minha razão é ela, a pessoa que responde pelo nome de S.. que agora jaz dormindo ao meu lado enquanto a agrido com loucuras peçonhentas e abismos alcoólatras, drogados, repugnantes.
É a ela que devo, a ela me dirijo e hei de proteger, servir e amar
A ela que dirijo minhas desculpas e sentimentos, e meus defeitos e virtudes
A ela que me aguenta, que me sustenta com carinho.
Para ela, com ela até o fim.


Compaixão

A compaixão é também nociva
Quando se sobrepõe aos limites
Quando torna-se altruísmo inútil
Quando apenas transfere o sofrimento de indivíduo
Assim,  é nocivo a ambos, a todos

Feliz é o ser que não sente e não vê
Que todas as noites dorme tranquilo
Sem empatia e sem remorsos

Sem aflições, arrependimentos
Sozinho

Casco Casi

Casco, cascos do caos
Casos, de casuais Castros
Medo de casuais, casuais...
Casi me enforco
.....
Ou quase me desespero...
Quase não me ofende, quase não existe
Que diferença faz??
Exista de vez! E morra no final..
Morremos então, todos juntos.

Ou quase...

Bove(a)ry

Cruzo bares imundos pela noite escarlate
Entre bêbados moribundos, refúgio
Na sua desesperança, a terra sempre abriga
Suas dores, seus gemidos, suas serenatas

E eu que, sem medo, navego pelas águas
Negras de fel e loucura
Abrigo-me e regozijo-me
Com as almas feridas e desalmadas

E as mesmas almas que sofrem o desespero
Cantam a desonra e a dor
As bocas desmembradas, gritam
No teu chão Bovery, teu esmero

Eu sigo para as luzes
Que não abrigam melhor que tu
Pois a sede, a cobiça vazia obriga
Nos impulsiona ao covil de abutres

Mas eu volto pra ti, Bovery
Que não entende, mas conforta
A perda, o sonho, o desgosto
A loucura que chora e ri

Mais que uma madame promíscua
Mais que um berço de insana hospitalidade
Envolve-me no teu manto
Ó impura, cruel dor, que não cura
Mas sacia minha sede de insanidade





Antítese do Desejo

Sob a linda luz âmbar e quente do sol
Eu lembro as trevas e o frio
Sob mantos de areia e sal
Eu lembro frígidas brisas que cortam a pele
Sob pureza de ar e paisagens naturais
Eu lembro fétidos odores e caóticas vias
Sob límpidas e refrescantes águas
Eu lembro um vazio que afoga

E sob trevas e gelo
Eu lembro o sol e a maresia
E com os pés gelados
Me lembro de sal e paredes rochosas
Sob cimento e pandemônios de loucura
Eu lembro belezas assimétricas e puras
E mesmo sob o pó que me cobre

Eu aspiro e inspiro chamas refrescantes naturais e vivas