sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

"New", Paul McCartney, outubro de 2013

 Com uma proposta bem distinta dos seus últimos trabalhos, “Kisses on the Bottom”, de 2012 e “Memory Almost Full”, de 2007, o disco sugere o que diz o próprio título, novo, claro que nada que nunca tenha sido feito antes na história da música, obviamente, porém é um disco recheado de sintetizadores e variados efeitos, com baladas clássicas no seu estilo, belas harmonias vocais, guitarras, uma levada pop e a qualidade genial deste que pode ser o maior nome da música no século XX.
 O primeiro single, “New”, foi lançado um pouco antes do lançamento do disco, que foi em 11 de outubro de 2013, e remete bastante ao som dos Beatles, principalmente no disco “Revolver”, de 66, a sua levada, seus efeitos e sonoridade, como se hoje fosse possível extrair exatamente o que queria Paul naqueles dias, porém de maneira absurdamente mais facilitada, devido a toda a tecnologia disponível nos dias atuais, mas é claro que, sem as alucinantes experiências sensoriais vivida pelos Beatles nos anos 60, o que dá um clima único daquele tempo à sua obra, e que não retornará. Se pensarmos que também nos anos 80 havia essa sensação de “o futuro chegou”, com exagero nos efeitos e possibilidades no estúdio, este disco é bastante coeso, pois divide bem as proporções sobre efeitos eletrônicos e a simplicidade rústica clássica do rock, bem diferente daquele super mal recebido disco de 86, “Press to Play”, onde este também intenciona soar contemporâneo e atual, porém o que vemos hoje é um disco que compete no máximo com algum disco chato do “Tears For Fears”.
 Há também o single “Queenie Eye”, com a levada bem marcada pelo piano, assim como em várias outras faixas do disco, típico de McCartney, onde também há a harmonia entre os sintetizadores, harmonias vocais e efeitos variados. Em um ritmo dançante, a música representa bem o estilo do disco e sua euforia. Também há o vídeo para esta faixa, com participações de estrelas hollywoodianas, entre outras, tal como Johnny Depp, que também aparece no recente clip de “My Valentine”.
 A produção ficou a cargo de quatro produtores, alguns
 filhos de amigos seus, também dando a nítida intenção de atualidade e mistura de influências. O time conta com Ethan Johns, que produziu Kings of Leon e também é filho de Glyn Johns, engenheiro que trabalhou com os Beatles e também com os Wings; Giles Martin, este filho do mestre George Martin; Mark Ronson, que produziu Amy Winehouse e por último Paul Epworth, este que produziu a cantora Adele. Com quatro diferentes produtores, o disco muda de clima e de atmosfera conforme seguimos ouvindo-o, porém mantendo sempre presente o clima de pop e de rock, os efeitos moderados e os belos preenchimentos vocais, característicos em toda a carreira do mestre, exceto se falarmos de sua obra erudita.
 Talvez não seja seu melhor disco na década de 00, porém é muito rico, um disco feliz (exceto talvez pela última faixa, “Struggle”, que soa bastante melancólica), que aponta o quão longínqua ainda será a invejável carreira de McCartney, que esbanja saúde, simpatia e genialidade, dando a garantia de um futuro ainda promissor e de sucesso, e também esperanças de mais shows ao redor do planeta.


Clip de "Queenie Eye"

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

As dimensões da ignorância

 A atmosfera emburrecedora debruça-se sobre minha cabeça novamente. Às vezes, parece que vivemos em um mundo; uma realidade, com inúmeras dimensões que, uma vez justapostas, apontam o atrito inevitável dessas dimensões, a sua impossível possibilidade de coexistirem, o que o fazem, de fato, pois coexistem. Em questão de minutos, ou de alguns quilômetros, atravessa-se múltiplas camadas de atmosferas culturais, que representam o comportamento, o intelecto, a imagem visual, o vocabulário, as vestimentas e os valores morais e sociais, causando um conflito absurdo de diferenças que, atrasam qualquer desenvolvimento mútuo de socialização. É absurdo como são tão distintas as noções de sentido da existência, de mundo. E o mais incrível é a facílima capacidade de comparação destas ideias, tão universalmente distintas e tão próximas. Famílias que discordam tanto que, em nenhum momento sequer insinuam a ideia de família, de unidade. Pois na verdade, o que importa mesmo é para onde vamos e o que fazemos; o que nos tornamos e somos, e não de onde viemos, ou o que têm, ou mesmo quem são os nossos parentes sanguíneos. Nossa origem para nada serve além de apontar nosso tipo sanguíneo para o fim de algum transplante de órgãos, para ostensivas festas efêmeras de casamento; aniversário, e para aborrecimentos devido a calúnias inventadas por uns, vivida por outros e difamada por todos. A preocupação dedicada à vestimenta, ao modo que se ganha a vida e as relações amorosas, superam qualquer afinidade emocional e cultural entre legítimos parentes. Salvo poucas exceções de ajuda recíproca isenta de qualquer cobrança material, porém basta que nos afastemos de nossos parentes, que nos ajudam ou são ajudados de alguma forma, para que as pequenas difamações surjam e por fim, para que estas inundam os assuntos nos momentos alimentares coletivos. Almoços e jantares. É claro que nem todas as famílias desfrutam dessa relação repugnante e melancólica, porém em meu caso, tal como relata Henry Miller o seu, é que, sempre fui o diferente, desde a infância, traumatizando-me uma cultura e comportamento familiar que enaltece a burrice e a ignorância, fazendo com que, na adolescência, me descobrisse, percebendo que não era eu o diferente, mas a família, o lugar, os costumes daquela gente que me rodeava é que eram distintos dos meus, pois quanto mais adulto me tornava, mais diferente deles eu ficava, e a cada dia faço mais questão dessa diferença, desse afastamento, pois nos seus mundos medíocres, o conhecimento é aberração, a arte é maluquice, o mundo é a televisão e a vida é a honra de morrer trabalhado e servindo à uma mentira. Apenas pena é o que me resta. Triste constatar valores que, uma vez sagrados, conquistados com inúmeras batalhas; metas atingidas; aprendizados desbravados, sejam aniquilados por uma horda de ignorância que transcende qualquer lapso de aceitação saudável, aniquila qualquer sinal de empatia, sufoca a esperança na humanidade.

 Penso se quem realmente teria alguma razão, algum impulso puro de seguir sua jornada, não seriam os bêbados inveterados que bebem para viver, para seguir respirando, ao menos nesta cidade esquecida no mapa, entre essas pessoas com número de fabricação em série, que desenvolvem a filosofia de suas vidas pelos ensinamentos propagados pela caixa de tela azul com o botão mágico na sala de estar. Pois sentido, isso não faz de jeito nenhum.

domingo, 10 de novembro de 2013

Ghost

 Quando ouvi pela primeira vez achei desnecessária, comum, insonsa a banda Ghost, pois o som apresenta um heavy metal comum, sem quebras de ritmo, sem grandes solos e harmonias complexas e principalmente, sem um vocal poderoso, cheio de vibratos e high pitches, tal como sempre admirei no heavy metal, considerando essenciais tais técnicas "dickinsonísticas", porém eu estava enganado em relação à sua mediocridade.
 A banda faz sim um heavy metal de instrumental básico, porém de qualidade, mas todos sabem que o que faz o tamanho da banda, e sua fama mundial, é o visual teatral acompanhado de suas macabras e satânicas letras. Isso por si só já seria motivo de críticas, pois existem muitas bandas clássicas que já  fizeram um papel teatral no palco no passado. Alice Cooper, David Bowie, Kiss, King Diamond, Slipknot e até Marilyn Manson entra na lista das bandas teatrais e cênicas na história do rock n' roll, além do gênero black metal, desde o clássico Venom até os contemporâneos e melódicos Cradle of Filth, estilo este calcado no visual e letras impressionistas, satânicas, com referências literárias e góticas, porém essa banda em questão tem sim, elementos diferenciados. O visual e letras são uma afronta direta ao clérigo cristão, todo o visual é baseado na igreja católica, tal como uma versão negativa, de outra dimensão, tipo uma anti matéria formada por átomos de potência igual, porém inversa a do vaticano e suas excentricidades, algo talvez nunca feito por outro artista de forma tão fiel, tão ferrenhamente blasfêmia (a não ser a banda sessentista The Monks, cujo visual era também inspirado em monges, porém desta, pode se dizer que foram precursoras de um proto punk nunca visto até então) e provocativa aos costumes católicos, tão presentes em certos países europeus e no Brasil.  Porém no que me cabe como cantor, repito que estava enganado sobre a simplicidade do vocal da banda, pois com a ajuda de um amigo guitarrista, este que fez aulas em sua adolescência de canto gregoriano, mostrou-me a apuração de tal técnica, como é projetado o som da voz neste estilo, e toda a sua dificuldade e precisão, fato este que remeteu-me diretamente a banda citada, pois não obstante, a banda zomba de forma inteligente e apurada toda a cultura cristã, desde o visual até este estilo de canto, típico dos antigos monges europeus e que no contexto da banda exalta satanás e outras vulgaridades anti católicas (também lembrando a trilha do filme "The Omen" de 1976, no Brasil "A Profecia", de trilha sonora original composta por Jerry Goldsmith, que também consiste em canto gregoriano satânico), no entanto, apesar dessas qualidades, a sua originalidade não ultrapassa os nomes já citados aqui .
 No seu disco de estréia Infestissumam (2013), podemos evidenciar  esta teoria citada no texto, basta uma ligeira ouvida nas primeiras faixas e uma vista em suas performances no Youtube.




quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Twixt - Francis Ford Coppola - 2011



É tudo uma espécie de sonho, um insight, uma viagem do escritor dentro da própria obra que ele está desenvolvendo. A história da busca pelos culpados da morte da guria é um reflexo, uma metáfora, uma versão lúgubre e sangrenta da culpa que ele sente pela morte da própria filha, a busca do porquê. Como se ele transferisse esse sentimento para a sua própria arte; sua obra, recriando um cenário comum na sua literatura, porém buscando novas inspirações e personagens em sua própria experiência pessoal e artística.

Gostei do filme, tem uma fotografia linda, com muito fundo chroma, um roteiro às vezes meio confuso, mas interessante, com várias citações literárias e estranhezas que, particularmente, gostei bastante. De qualquer forma, é um filme esquisito, diferente de outros premiados trabalhos do mestre Coppola, no entanto, acho bastante válida a sessão. E Val Kilmer não está horrível e ridículo, tal como citam alguns críticos na web, pelo contrário, surpreendeu-me pela atuação em um gênero cujo não lembro este haver trabalhado antes. Há algumas cenas forçadas, tal como quando a personagem Flamingo salta de motocicleta, fazendo talvez uma alusão a Sin City, ou aos quadrinhos em geral, mas que no contexto do filme não ficou, assim, "boa".Também sequências "flutuantes", vagas, meio desconectas, alguns clichês básicos de maquiagens e visuais também são constantes, porém de maneira geral, como disse, é um filme muito bom. Para quem aprecia literatura fantástica e gótica, pode ser uma boa inspiração, inclusive a personagem principal lida com "aparições" de Edgar Allan Poe, cujo o ajuda a desvendar o mistério e consequente conclusão de sua obra, Poe então interpretado por Ben Chaplin. Recomendo.

Cheers!!


segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Minha Ideia de Diversão - Will Self - romance inglês - 1993

Crueldade, surrealismo. Um perfil insano traçado de uma personagem quase impossível de conceber em um mundo real, no entanto, ao mesmo tempo, tão intrincada no cotidiano de uma Inglaterra por ora pacífica, simplista, retratada dos altos de penhascos onde veranistas tiram suas tranquilas férias em trailers alugados, inalando a maresia e uma paz interiorana dos anos 70, contrastando com uma caótica e corporativista Londres do marketing exacerbado inchado de tantas empresas e produtos efêmeros. Dentre isto tudo, um jovem, que vira homem, que pode ser louco, maníaco, esquizofrênico, mas que se auto denomina "eidético", uma condição única de visão ultra dimensional, de memória fotográfica, de leitura dinâmica e de um poder imaginativo que transcende qualquer noção  mística de paranormalidade. E como se não bastasse, o guia, guru que direciona, oprime, esclarece e compartilha deste dom  com a personagem, que o conhece e o inicia ainda nos primeiros anos de vida, que o segue para a vida adulta,  às vezes parecendo ser o ser maléfico que oprime, às vezes atuando como pai adotivo, às vezes como o professor arbitrário, com um vocabulário único e vestimentas elegantíssimas, sempre carregado de seus charutos fumacentos. Este ser no livro, entre outros nomes, chama-se O Controlador Gordo...
Desenvolvido de maneira muito original, criando um diálogo bastante pessoal entre o protagonista e o leitor, Minha Ideia de Diversão é um livro bizarro e por que não, genial. Escrito de forma inteligente, alternando o texto entre o vulgar e o marginal, para o requintado e o intelectual, cheio de citações literárias, adjetivos absurdos e imagens quase inimagináveis, ele te confunde, te desdobra, te faz rir, te surpreende e te enoja, porém com um ritmo de prosa ligeiro e instigante, comparado inclusive por críticos a Shakespeare, tornando a obra indispensável para quem acha que já leu de tudo.

Disse o autor que queria escrever um livro que assustasse as pessoas, para mim, a catarse foi causada pela confusão mental diante de imagens surrealistas, que te assustam pela complexa descrição detalhada da loucura, às vezes te confortando pela possibilidade de alucinação, e também às vezes, te tornando cúmplice da crueldade e da perversidade, aberrações talhadas como desejos comuns de uma mente simplesmente solitária e inquieta.

Pesquise sobre a obra e seu autor, vale muito a pena!!

domingo, 8 de setembro de 2013

O que faz a vida



 Quando tinha 14, 15 anos, sonhava com um futuro artístico comparável a de um legítimo rock star internacional. Imaginava-me cantando, lá pelos meus vinte e tantos anos, em frente a uma grande banda, sob luzes e aplausos, dominando uma postura de palco grandiosa, entonando vozes de maneira técnica e precisa, em frente a multidões, cantando com minha banda o meu próprio material, que seria sucesso, que renderia prêmios, paixões e dinheiro. Via-me em concertos de grandes cidades, clubes, festivais, com figurinos únicos e personalizados, ovacionado pela crítica e público em geral.
Hoje vivendo os ditos vinte e tantos anos, percebo que não fora tão longe as fantasiosas imagens que surgiam na minha cabeça adolescente, que meus passeios imaginativos diários não se tornaram tão distantes e absurdos na atualidade, já que canto hoje em várias bandas de rock. Já gravei e executei material próprio de maneira modesta, porém considerável, domino uma performance segura com alta postura e presença de palco, atingi uma técnica vocal bem além das expectativas, conjeturadas de maneira ingênua no passado. Desenvolvi um repertório razoável no formato solo, executando voz e violão, patamar sonhado de forma bem distante na adolescência. Já senti algumas vezes a emoção e a energia louca de estar sobre um palco cantando em frente a muitas pessoas, na mira de todos os olhares e de toda a atenção. Já ouvi muitos elogios após o show e já até me acostumei a eles, no entanto penso, que sentido faz isso? Penso se não desperdicei anos de energia em uma atividade que não ultrapassará o hobbie e o amadorismo, penso se não devia ter investido a mesma energia e foco em coisas mais reais e possíveis de se atingir o devido sucesso e reconhecimento, podendo enfim ultrapassar a barreira do amador para o profissional. Mas também penso e por fim me convenço de que, se há uma época na vida em que se tem energia e vontade é nesses 14, 15, vinte poucos anos e que me arrependerei muito se, quando não houver mais a força e a energia pueril e raivosa da minha juventude, eu quiser voltar no tempo para gastá-la como realmente sonhara a vida toda, como a imaginei desde a puberdade, assistindo aos mais jovens executarem suas proezas de forma triste e saudosa. E isto também mostra que, quando nos visualizamos já fazendo a coisa sonhada, quando vivemos e respiramos uma vontade e um sonho todos os dias, que quando acreditamos muito em nós mesmos, muito mais do que qualquer outro possa, atingimos, mesmo que parcialmente, o objetivo. O universo, a vida ou a vontade canalizada tende e impulsiona nosso destino, nos atraindo, nos empurrando ao futuro que permeia nossos pensamentos e desejos diários, pois me vejo muito próximo daquela figura que imaginava a mim mesmo quando adolescente, sem as devidas proporções megalomaníacas, porém dominando muitos aspectos fundamentais do estereótipo que desejava atingir no futuro, realizando muitas das proezas sonhadas. Mas ainda penso, tem sentido isso? Hoje reconheço tais fatos, porém não sinto a satisfação ou o alívio de dever cumprido. Penso muitas vezes estar realmente perdendo tempo, perdendo energia, desperdiçando talento. Porém hoje, da mesma forma que me imaginava um músico de sucesso na flor da idade, me imagino hoje um futuro escritor de sucesso já ultrapassando a meia idade, um senhor com fôlego pra falar e sabedoria para lapidar as palavras e os dizeres. No acúmulo de anos e sabores provados, me imagino experiente, vívido e vivido, culto e forte, para desdobrar assuntos, diálogos e histórias, para contar e recontar o que há de ser dito e escrito, a ouvidos e olhos interessantes e interessados. Viajado e lido, com muita bagagem literária e de estrada, muto bem acompanhado por mulher, filhos e netos, talvez também bem acompanhado por médicos e medicamentos e dietas rigorosas, porém sempre com mais livros e conhecimento. Sinto a nostalgia eufórica e melancólica que atingirá minhas entranhas. Vejo-me muito mais sensível e caprichoso. Mais vivo por conhecer mais de perto a morte e quem sabe, satisfeito e enfim, orgulhoso do dever cumprido, da vida vivida. Vejo isso e sei que atingirei, pois tudo isso é treinamento. Cada hoje é um aprendizado para o amanhã.




Mas sei que sou dois

Yng e yang, um pêndulo inconstante

Temo e enfrento, aconselho a mim mesmo

Conselhos que dou e não sigo

Sou bipolar, multipolar

Quero e depois não quero

Ou sinto que não sei, às vezes me desespero

As dúvidas me matam, porém lembro o que sonhei

E sei o que vejo e sinto agora

E sonho querer mais e com mais força

Pois sei que é possível

Pois naquilo que amo e me enxergo

Sempre hei de recomeçar



sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Os Subterrâneos - Jack Kerouac

 No princípio, a maneira como se distribuía o texto incomodou-me por demais, o achei tosco, impulsivo, me parecia um devaneio lunático, como se o tipo estivesse há 3 dias cheirando cocaína, bebendo café e escrevendo sem parar tudo o que lhe viesse a cabeça, como se nada pudesse ser desperdiçado ou mesmo filtrado. Mas logo antes da metade do livro, acredito, adaptei-me a esse ritmo frenético kerouaciano, com todos os seus parênteses seguido de parênteses seguidos de mais parênteses, quase sem vírgulas, pontos ou divisões, um raciocínio e relato que levava a outro e a outro ainda, me fazendo às vezes voltar a página para recordar o que era mesmo que estava sendo dito ali.
 Mas a importância artística e histórica desta obra é indiscutível, tanto pelo estilo único e incomparável de Kerouac, quanto pelo que ali é apresentado, um romance entre 2 "subterrâneos", hips, beats, em uma San Francisco de clima caótico e alucinado, em meio a discussões malucas literárias, festas e bebedeiras entre poetas, artistas, regado a muito bop  e muitas noites sem dormir, além da profecia triste e melancólica do fim do grande escritor, proferida por ele mesmo neste livro, seu fim pelo alcoolismo e loucura.

Uma grande obra, não a melhor do mestre, mas uma fundamental. 





Crônica do Aniversário

 Aniversário, o que é isso senão uma data para nos deprimir e nos fazer gastar pestanas pensando e sofrendo? Quando não uma grana considerável.
 Os anos são calculados pela soma de cada grau; valor, de um todo, que soma trezentos e sessenta e poucas porções, que equivalem e medem de fato a volta completa no sol da terra. Então são trezentos e sessenta e cinco dias, mais algumas horas, segundos etc. Vago e inexato. Impreciso, sempre vão sobrar nessa contagem dias, horas, minutos, segundos. Assim surgindo o ano bissexto, o dia 29/02, para compensar essa medida e rotas inexatas, evidenciando a imperfeição e variação de tudo. Então aquele dia específico não tem nada a ver com o dia em que nascemos, ou qualquer dia, volta, que já tenha ocorrido na terra. Seria uma posição próxima em que a terra estaria antes, na mesma marca; dia, de um ano atrás, ou uma volta, mas não exatamente a mesma, além de que, todo o cosmos estaria diferente, devido sua longa e contínua expansão.
 Ficamos mais velhos? Enrugamos? Perdemos a visão? A coluna dói? Ficamos mais precários, sensíveis e doentes? Sim, óbvio, mas isso ocorre todos os dias, não naquele dia específico, não no aniversário apenas, não é somente este que vai nos envelhecer imediatamente, mas todos os dias, a cada minuto, segundo, todos os sintomas da velhice chegam simultaneamente, todo o tempo. O tal dia do aniversário não determina ou transforma qualquer coisa, apenas soma-se como todos os outros dias. Como seres orgânicos, estamos destinados a perecer e servir de adubo aos que ainda rastejam nesta terra. As células freiam. A produção decai. O sistema falha. E a coisa segue em uma regressão física. A energia dissipa-se, a mecânica química entre cérebro e terminações nervosas não são precisas e imediatas. O rendimento murcha. E nos frustramos com nossas experiências ainda não registradas que se apagam, nossas histórias que vão morrendo conosco. Toda nossa existência se resume em memória, se houver sorte, pois só permaneceremos vivos em gerações futuras por meio desta.
 O aniversário serve para imaginarmos, nos prepararmos, criar uma expectativa, uma ambição, de que seja um dia especial. O seu dia. Que algo especial irá acontecer. Quando passam as horas e percebe-se então que foi tão igual e corriqueiro quanto os outros, vem esse sentimento mesquinho e deprimentemente humano, esse vazio da esperança destroçada. A decepção.
 Um símbolo apenas, uma marca do nosso nascimento. Mobilizando pais e padrinhos a produções expansivas de festas efêmeras que servem apenas como pretexto, ou até desculpa, pela falta de atenção necessária diária para com os pequenos, como um modo de ostentação de valores materiais, posses e figurinos, induzindo a uma futilidade burguesa desde cedo o indivíduo homenageado. Promovendo comilanças descomunais, bebedeiras, danças e música, tudo enfatizando o aniversariado, porém sendo oferecido aos demais convidados que, muitas vezes, saem reclamando e apontando defeitos de modo geral na festa e nas pessoas que por ali estavam.
 As debutantes. Talvez o maior exemplo de imbecilidade no quesito comemoração de aniversário. Talvez o maior exemplo de todo esse comportamento mórbido e sinistro apresentado. A simples passagem por esse dia que marca no calendário nosso nascimento deve ser confraternizada com entes queridos, filhos, mães, esposas e namorados, amigos próximos, e ninguém mais! Um aniversário de casamento, de namoro, merece um jantar romântico, uma boa noite de sexo, mas todos os casais devem praticar isso constantemente, não apenas nesta maldita data que nada representa, além da obrigação de ter que se fazer algo em relação a ela. Um jantar forçado de cara fechada. Uma festa deprimente. Uma noite tão sonsa que, talvez se não fosse relacionada à referida data, seria especial.
 O ser humano é cheio de símbolos sagrados, de dogmas estipulados de outras eras que, já não faziam sentido no momento de sua criação, o que dirá dos tempos atuais. Precisamos aprender a nos desvencilhar de práticas antigas e nocivas à nossa existência, à vida, à razão e à sobrevivência do planeta.
 A debutante e a cerimônia que apresenta a filha jovem à sociedade, como um troféu a ser conquistado, justificando os antigos dotes e preços, dinheiro oferecido pelo pai a quem se encorajava a retirar sua filha de casa pela mão. O que me espanta é ver tantas mulheres que não reconhecem nestas práticas a depravação da mulher tal como objeto, em simples ferramenta à servir a vontade do homem, prática absurdamente cristã, que subjugou o feminino cruelmente por tanto tempo, práticas que ainda resistem em comunidades mais remotas, onde as mulheres são apresentadas na sua adolescência a pretendentes munidos de posses financeiras, e que em seguida, se tornam escravas das funções domésticas, sem opinião e tampouco personalidade.
 E ainda temos o canto extremamente ridículo entoado em todas as cerimônias aniversariais, o Parabéns a Você. A música é datada do século XIX, composta por professores para as crianças em uma determinada escola nos Estados Unidos, porém ela continha uma outra letra, uma inocente saudação matinal em que as crianças então cantavam no começo de sua jornada escolar. Era popular tal canção, no entanto, passaram-se alguns anos e alguém em algum livro idiota alterou a letra, transformando a singela música nessa retumbante, insuportável e ridícula ode a um dia que, sim, marca de alguma forma nosso nascimento, mas não evidencia de fato qualquer valor de nossa passagem pela terra, apenas essa data efêmera que nos impõe obrigações materiais que resultam, muitas vezes, em frustração, ao invés da planejada diversão e homenagem. Talvez esse canto tenha algum valor se pensarmos na libidinosa performance de Marilyn Monroe ao então presidente norte americano John F. Kennedy que, com certeza, inspirou pensamentos luxuriosos e excitantes, mesmo com uma letra tola e inexpressiva. É isso, a data, o encontro, é você quem faz, e de resto, são apenas bobagens ultrapassadas.



They're Free

They're free
Free as a bird
Free as a demon
Free as an artist
Free as a hole in the sky
Free as a killer
Free as a worm
Free as a lie
Freedom IS a lie
Free as a hungry dirty mad beggar in the streets which are asylums


Maybe you’re free, if you're dead..

Palavras

Palavras, tenho muitas
E muitas mais hei de pegar
Por isso não há pressa
Não tenho que ser afoito, em pescá-las
Elas vem e vão, sobrevoam
Me basta apenas mirar e agarrar

E mais palavras tenho para rabiscar

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Pra ela

E essas letras me perturbam, me paradoxam
Não me reconheço, nesses rabiscos ultra alucinados imperativos
Me censuro, me podo
Não enxergo o que outrora mostrei
Não me raciocínio, não me desvendo

E não tenho uma saída, não me resolvo
Sigo preso dentro desta...coisa, não conheço o símbolo para essa coisa...
Tampouco algo semelhante para a minha vontade
Mas sei que, o pouco que sei serve, basta, para medir o que já sei
E o nada que sei é que sei que tenho consciência, naturalmente
Com todos os infortúnios e negativas
Com todas as variações atmosféricas e inconstâncias sentimentais
Mesmo com todas as burrices evidentes, todas as estupidezes e idiotices
Aplicadas, sentidas, vividas, reclamadas e defendidas
Mesmo com toda essa impotência escancarada, esse minúsculo tamanho
Assim mesmo, eu, burro, pequeno e frágil
Simples, complexíssimo, desmontado, melhorado, atordoado, esculhambado
Mesmo assim, eu sei, tenho certeza, porque eu sinto, e eu devo e busco viver o que sinto
E a minha vida, o meu dever comigo, para minha existência, para a minha consciência e passagem pela coisa que chamamos terra
Eu sei, vou cada vez mais fundo, mais crente, mais confiante, mas rígido e forte com os golpes, e mais sábio, ou menos tolo, para o meu prazer, o meu sentido, que é comum, que é dividir a vida, o ar, o conhecimento e experiência, tudo aqui é de todos
Todos um, juntos, lutando e se amando, e eu já escolhi a minha metade
O motivo, a razão para seguir, acordar e compartilhar com tudo
Minha razão é óbvia, e digo isso à mim mesmo, porque a isso deve a minha vida, a vida vivida, gozada, a também divulgada ideia e sentimento chamado felicidade
Minha razão é ela, a pessoa que responde pelo nome de S.. que agora jaz dormindo ao meu lado enquanto a agrido com loucuras peçonhentas e abismos alcoólatras, drogados, repugnantes.
É a ela que devo, a ela me dirijo e hei de proteger, servir e amar
A ela que dirijo minhas desculpas e sentimentos, e meus defeitos e virtudes
A ela que me aguenta, que me sustenta com carinho.
Para ela, com ela até o fim.


Compaixão

A compaixão é também nociva
Quando se sobrepõe aos limites
Quando torna-se altruísmo inútil
Quando apenas transfere o sofrimento de indivíduo
Assim,  é nocivo a ambos, a todos

Feliz é o ser que não sente e não vê
Que todas as noites dorme tranquilo
Sem empatia e sem remorsos

Sem aflições, arrependimentos
Sozinho

Casco Casi

Casco, cascos do caos
Casos, de casuais Castros
Medo de casuais, casuais...
Casi me enforco
.....
Ou quase me desespero...
Quase não me ofende, quase não existe
Que diferença faz??
Exista de vez! E morra no final..
Morremos então, todos juntos.

Ou quase...

Bove(a)ry

Cruzo bares imundos pela noite escarlate
Entre bêbados moribundos, refúgio
Na sua desesperança, a terra sempre abriga
Suas dores, seus gemidos, suas serenatas

E eu que, sem medo, navego pelas águas
Negras de fel e loucura
Abrigo-me e regozijo-me
Com as almas feridas e desalmadas

E as mesmas almas que sofrem o desespero
Cantam a desonra e a dor
As bocas desmembradas, gritam
No teu chão Bovery, teu esmero

Eu sigo para as luzes
Que não abrigam melhor que tu
Pois a sede, a cobiça vazia obriga
Nos impulsiona ao covil de abutres

Mas eu volto pra ti, Bovery
Que não entende, mas conforta
A perda, o sonho, o desgosto
A loucura que chora e ri

Mais que uma madame promíscua
Mais que um berço de insana hospitalidade
Envolve-me no teu manto
Ó impura, cruel dor, que não cura
Mas sacia minha sede de insanidade





Antítese do Desejo

Sob a linda luz âmbar e quente do sol
Eu lembro as trevas e o frio
Sob mantos de areia e sal
Eu lembro frígidas brisas que cortam a pele
Sob pureza de ar e paisagens naturais
Eu lembro fétidos odores e caóticas vias
Sob límpidas e refrescantes águas
Eu lembro um vazio que afoga

E sob trevas e gelo
Eu lembro o sol e a maresia
E com os pés gelados
Me lembro de sal e paredes rochosas
Sob cimento e pandemônios de loucura
Eu lembro belezas assimétricas e puras
E mesmo sob o pó que me cobre

Eu aspiro e inspiro chamas refrescantes naturais e vivas

sábado, 5 de janeiro de 2013

Black Country Communion


Seguindo a tradição dos supergrupos do anos 70, o Black Country Communion mostra um hard rock pesado muito funkeado, com linhas impressionantes de baixo e ótimas harmonias e solos de guitarra.
A banda foi formada em 2009 e conta com Joe Bonamassa na guitarra, músico conceituado nos EUA já com vários discos na carreira, alguns que seguem uma linha mais country acústica, também muito influenciado pelo blues, porém no BCC ele exalta sua distorção e peso, com solos e riffs dignos de heavy metal, também fazendo os vocais solo de algumas faixas. No baixo, o mestre Glenn Hughs, ex Deep Purple, manda no groove da banda e na voz principal, com performances ultra performáticas, o velho Hughs surprende com seu vigor e postura no palco, um mestre. Na bateria, nada mais nada menos do que Jason Boham, filho de um certo John Boham, que pode ser visto no filme/show do Led Zeppelin The Song Remains the Same, pequenino com seu pai em uma bateria adaptada. Além de vários projetos, apresentações com os colegas do papai, Jason também aparece no filme Rockstar junto com Zakk Wilde, sendo o baterista da banda fictícia Steel Dragon, com certeza um grande músico. E ainda temos no grupo o tecladista Derek Sherinian, ex Dream Theater, que complementa de forma fundamental os arranjos nos dois discos da banda, lançados respectivamente em 2010 e 2011, colorindo e realçando o som da banda com solos incríveis, por ora também lembrando o timbre hammond do mestre falecido John Lord.


Uma banda para quem gosta de hard rock, de rock pesado com groove, para quem já conhece o trabalho individual destas feras, uma banda genuinamente foda.